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25 de Abril de 2024

Decisão que proíbe apreensão de veículos por atraso no IPVA.

Publicado por Rafael Rocha
há 6 anos

Segue a íntegra da liminar concedida no dia 19/12/2017 para impedir que veículos sejam apreendidos por falta de pagamento no ipva.

PROCESSO Nº 5408687.35

DECISÃO

Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA protocolada pela ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL ? SEÇÃO GOIÁS em face do ESTADO DE GOIÁS, SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DE GOIÁS, SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS, COMANDANTE GERAL DA POLICIA MILITAR DE GOIÁS e DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DE GOIÁS - DETRAN, visando a suspensão imediata da apreensão de veículos automotores em razão do não pagamento de IPVA, e a determinação ao órgão de trânsito, para que viabilizem a possibilidade de pagamento em separado das taxas de licenciamento, bem como outros débitos existentes, permitindo-se a expedição do CRLV dos veículos, sob pena de multa diária

Aduziu que a Secretaria da Fazenda ? SEFAZ/GO e a Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária ? SSP/GO, firmaram em 21/07/2015, Termo de Cooperação nº 002/2015, o qual objetiva ?a conjunção de esforços entre os partícipes, com vistas a executar os serviços de policiamento preventivo, repressivo, operações especializadas, fiscalização e controle de trânsito em apoio a ações de fiscalização de tributos estaduais.?

Sustentou que o Estado de Goiás, por meio de ação conjunta com as aludidas Secretarias, vem promovendo operações denominadas ?blitz do IPVA?, com escopo de apreender veículos automotores cujo crédito tributário relativo ao IPVA não tenha quitado.

Salientou que os proprietários dos veículos que estejam inadimplentes com o referido tributo poderão ser abordados na mencionada operação, bem como terem seus automóveis apreendidos até que quitem os débitos em atraso, sendo condição indispensável para a restituição do veículo.

Ponderou que além do pagamento dos tributos, do seguro obrigatório e das eventuais multas, o proprietário deve arcar com despesas de reboque e as diárias pelo período em que o veículo ficar apreendido no DETRAN/GO.

Discorreu sobre o que lhe era de direito, pugnando, em sede de liminar, a suspensão imediata da apreensão de veículos automotores em razão do não pagamento de IPVA, bem como pela determinação ao órgão de trânsito que viabilize a possibilidade de pagamento em separado das taxas de licenciamento, bem como de outros débitos existentes, como multas, permitindo-se a expedição do CRLV, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

Fez os demais pedidos de estilo e juntou documentos.

Devidamente notificado para se manifestar, o DETRAN/GO apresentou defesa, obtemperando a respeito da legalidade da medida administrativa de remoção do veículo por atraso no licenciamento, e, ainda, no condicionamento da emissão do certificado de licenciamento.

É O RELATÓRIO.

DECIDO.

Cediço que para o deferimento do pedido de liminar, dispõe o artigo 300 do Código de Processo Civil, que é necessária a presença de elementos que evidenciam a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

Destaco que as tutelas provisórias de urgência são tutelas não definitivas fundadas em cognição sumária, podendo ser requeridas em caráter antecedente ou incidente, devendo estar presentes os requisitos constantes no citado artigo de modo a não ensejar dúvidas.

Subdividem-se em tutela de urgência cautelar e tutela de urgência satisfativa ou antecipada, sendo que os requisitos autorizadores da concessão da tutela de urgência atingem todas as modalidades desta.

Porém, no que pertine à tutela de urgência satisfativa, além dos requisitos comuns à concessão da medida exige-se, também, que os efeitos desta não sejam irreversíveis.

Destarte, necessário, então, o perfazimento dos requisitos mencionados e o convencimento do dirigente processual em face da tese jurídica exposta em confronto com os fatos aduzidos e efetivamente comprovados.

A concessão ou não de eventual tutela de urgência de natureza antecipada impõe ao magistrado análise de sua irreversibilidade, ou seja, a possibilidade de retorno ao ?status quo? (art. 300, § 3, CPC). A irreparabilidade do prejuízo de quem pede a antecipação deve ser examinada em face da possível irreversibilidade dos efeitos causados pela medida.

Marioni, Arenhart e Mitidero, in ?Novo Código de Processo Civil Comentado?, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 312-313 aduzem:

A possibilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para tutela dos direitos é a probabilidade lógica ? que é aquela que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refutação desses elementos. O juiz tem que se convencer de que o direito é provável para conceder a tutela provisória. (?) A tutela provisória é necessária simplesmente porque não é possível esperar, sob pena de o ilícito ocorrer, continuar ocorrendo, ocorrer novamente, não ser removido ou de dano não ser reparado ou reparável no futuro. Assim, é preciso ler as expressões perigo de dano e risco ao resultado útil do processo como alusões ao perigo na demora. Vale dizer: há urgência quando a demora pode comprometer a realização imediata ou futura do direito.

Como se pode notar de tal preceptivo, a antecipação pretendida é medida processual extrema, sendo cabível tão somente nos casos em que a existência de possibilidade do direito vir acompanhada de perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

Cediço que o Código de Trânsito Brasileiro, notadamente em seu artigo 230, inciso I, determina as medidas administrativas, em caso da não emissão do documento para o exercício atual, in verbis:

Art. 230. Conduzir o veículo:

V - que não esteja registrado e devidamente licenciado

Penalidade - multa e apreensão do veículo;

Medida administrativa - remoção do veículo;

Ademais, o referido licenciamento é condicionado ao pagamento de débitos fiscais e de multas de trânsito, conforme preceitua os artigos 128, e 131, § 2º do mesmo diploma legal:

Art. 128. Não será expedido novo Certificado de Registro de Veículo enquanto houver débitos fiscais e de multas de trânsito e ambientais, vinculadas ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas.

Art. 131. O Certificado de Licenciamento Anual será expedido ao veículo licenciado, vinculado ao Certificado de Registro, no modelo e especificações estabelecidos pelo CONTRAN.

§ 2º O veículo somente será considerado licenciado estando quitados os débitos relativos a tributos, encargos e multas de trânsito e ambientais, vinculados ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas.

Ora, não obstante as legislações alhures, entendo, em nível de cognição sumária que o caso prescinde, que condicionar o licenciamento ao pagamento de tributo, ou seja, o simples débito tributário implicar na apreensão do bem, insurge em clara atuação coercitiva para obrigar o proprietário do veículo a saldar o débito, explico:

A Constituição Federal preconiza em seu artigo 5º, inciso II, que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Ademais, a ordem constitucional estabelece, ainda, que é vedada a utilização de tributo como efeito de confisco, isto em seu artigo 150, inciso IV.

Sabe-se que o confisco, no âmbito tributário, é o ato de apreender a propriedade em favor do Fisco, sem que seja ofertada ao prejudicado qualquer compensação em troca, apresentando caráter sancionatório, resultante da prática de algum ato contrário a ordem vigente.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal, já enfrentou a questão em apreço, firmando entendimento pelo impendimento da referida medida, detidamente quanto a apreensão de bens com a finalidade de receber tributos, veja:

Súmula 70 ? É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo.

Súmula 323 ? É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.

Súmula 547 ? Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça duas atividades profissionais.

Ato contínuo, o STF, em caso análogo ao vergastado nestes autos, proferiu entendimento quanto a apreensão de veículos em razão do não pagamento de IPVA, confira:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL 194/94. CÓDIGO TRIBUTÁRIO ESTADUAL. IMPOSTO SOBRE PROPRIEDADE DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. NÃO-PAGAMENTO. CONSEQÜÊNCIA. COMPETÊNCIA ESTADUAL. Código Tributário estadual. Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores - IPVA. Não-pagamento. Conseqüência: impossibilidade de renovar a licença de trânsito. Ofensa à competência privativa da União Federal para legislar sobre transporte e trânsito de veículos. Alegação improcedente. Sanção administrativa em virtude do inadimplemento do pagamento do IPVA. Matéria afeta à competência dos Estados-membros. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ? AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE: ADI 1654 AP).

Ao compulsar dos autos, no que tange à probabilidade do direito, esta se caracteriza, tendo em vista todas as informações e fatos colhidos quando do ajuizamento da exordial.

O perigo de dano, por sua vez, consta devidamente preenchido, haja vista que a continuidade das apreensões e do condicionamento do licenciamento ao tributo, causará prejuízo sobremaneira aos proprietários dos veículos que eventualmente estão com débitos fiscais.

Outrossim, cumpre esclarecer que para a cobrança do referido tributo, a Administração Pública possui meios próprios, qual seja a propositura da competente execução fiscal, bem como a consequente inscrição em dívida ativa.

No caso em comento, a concessão da presente tutela não prejudicará o recebimento de eventuais débitos referentes ao IPVA, no qual, caso verifique-se necessário, vislumbro a possibilidade da reversibilidade da demanda ao ?status quo?, requisito de admissibilidade da tutela de urgência.

Isto posto, pelo que se depura dos autos, ademais pela possibilidade de revisão a qualquer momento da presente decisão, DEFIRO A LIMINAR, oportunidade em que determino a suspensão imediata da apreensão de veículos automotores em razão do não pagamento de IPVA, e a determinação ao órgãos de trânsito que viabilizem a possibilidade de pagamento em separado das taxas de licenciamento, bem como outros débitos existentes, permitindo-se a expedição do CRLV dos veículos, sob pena de multa diária no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com teto máximo de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Oficie-se os requeridos para o cumprimento imediato da presente decisão.

Cite-se os insurgidos para, querendo, apresentarem contestação, no prazo legal.

Cumpra-se.

Goiânia, 19 de dezembro de 2017.

Zilmene Gomide da Silva Manzolli

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6 Comentários

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Eu estou falando também no meu tcc, da falsidade, da objetividade do licenciamento anual, que é tão somente burocrático e não cumpre sua finalidade. continuar lendo

qual é o tema principal e o problema do seu tcc? continuar lendo

Essa Ação civil pública do estado de Goiás é muito boa. Pena que é so de Goias. Em outros Estados continuam imperando a ilegalidade. pena. continuar lendo

Ola Bom dia,
Essa Medida pelo que entendi só vale para o estado de goias? continuar lendo

Agradeço a postagem, será usada no meu TCC sobre inconstitucionalidade da apreensão de veículos por falta de pagamento de tributos, tributos estes que vão alem do IPVA, e atinge até a TAXA de licenciamento. continuar lendo